Contra ou a favor, as
pessoas costumam ter uma opinião forte sobre cotas raciais. Isso ocorre porque
o assunto mobiliza nossas intuições de justiça, que constituem a base de
qualquerjuízo moral. O interessante aqui é que tanto defensores como opositores
das cotas pretendem ser os legítimos porta-vozes da equidade, atribuindo aos
adversários uma visão distorcida do conceito e mesmo do mundo.
A diferença de perspectivas,
creio, se deve ao fato de que cada lado aplica a noção de igualdade num momento
diferente. Para o sujeito anticotas, a igualdade que prevalece é a jurídica. As
regras devem ser rigorosamente as mesmas para todos, independentemente de raça,
classe social, inteligência. Já para os cotistas, a igualdade tem de
materializar-se nos resultados. Se negros e índios ficam sistematicamente para
trás na corrida por uma vaga na universidade, precisamos equilibrar o jogo,
dando-lhes alguma dianteira.
Tomadas pelo valor de face,
as duas posições levam a aporias. Uma plena igualdade de todos diante da lei
exigiria acabar com a progressividade do IR e as aposentadorias especiais, e
estender o serviço militar obrigatório às mulheres. Até programas para auxiliar
crianças disléxicas teriam de ser suprimidos. Já a rigorosa igualdade de
resultados, na qual até os salários de todos os cidadãos precisariam ser os
mesmos, destruiria a produtividade e a inovação. Algo assim já foi tentado com
o comunismo.
O que devemos discutir, portanto,
não é se ações afirmativas podem ser adotadas -a noção mesma de Estado
democrático envolve algum tipo de auxílio aos mais necessitados-, mas em que
grau e por quais instrumentos devemos implementá-las.
Pessoalmente, não gosto de
cotas raciais. A ideia de ver agentes do Estado conferindo a cor da pele e
outras características fenotípicas de cidadãos não evoca o melhor da
humanidade. Existem alternativas mais inteligentes, mas essa é outra história.
Blog Deu o Carai em Vitória
Hélio Schwartsman - FSP, hoje
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